Em número anterior desta revista, não me lembro qual – fizemos uma retrospectiva histórica da masturbação em diversas épocas e em diversas culturas. Achamos importante esta abordagem, pois assim, podemos entender os tabus e preconceitos, que ainda cercam o autoestímulo erótico, como instrumento de prazer.
Sabemos da etologia e da nossa própria observação, que os animais masturbam-se e que o bicho homem (Homo sapiens) também o faz. O processo civilizatório, que traz em seu bojo variantes culturais diversas, apresenta quase sempre preceitos morais e religiosos, que tenta muitas vezes, considerar a masturbação como ato devasso, comportamento primitivo, coisa feia, ação pecaminosa e mórbida.
Lembro-me que após proferir palestra de abertura de um seminário sobre sexualidade e adolescência, organizado pela Secretaria Municipal de Saúde de Campos dos Goytacazes, há alguns anos atrás, uma auxiliar de enfermagem levantou a mão e me perguntou?
* Doutor, masturbar é pecado? Antes que eu pudesse respondê-la, uma freira, de meia idade, vestida com seu hábito, pedindo-me licença, respondeu por mim: não é pecado não, minha filha. Veja bem estes adolescentes, meninos ou meninas, pobres que poucos recursos têm para se divertirem, e, ao tocar os seus corpos, sentem o prazer natural dado por Deus. Como pode ser pecado se eles não estão fazendo mal a ninguém. Deus não é esta entidade rigorosa e punitiva como muitos falam; Deus é bondade, é compreensão, é prazer e não dor. A irmã respondeu por mim – nada tenho a acrescentar, afirmei satisfeito.
Ao contrário do que pensam muitos, masturbar não é só estimulação dos órgãos sexuais. É, sobretudo, tocar o corpo inteiro, da cabeça aos pés, buscando os milhares de pontos sensórios capazes de nos proporcionar prazer. A natureza não nos fez iguais; diferentes, também, são as nossas zonas de prazer e é bom descobri-las. A exploração da forma de tocar, a pressão que se imprime aos dedos e às palmas das mãos, a percepção da textura da pele, os sentidos dos movimentos, dos toques personalizados provocam prazer, descobertos pelo autoestímulo.
É evidente, que durante a estimulação corporal, o imaginário faz parte do jogo. Neste momento de intimidade, a liberdade é ilimitada e a fantasia é infinita. A relação sexual deteriora-se, à medida que não a cultivamos. A fantasia e os toques do autoestímulo erótico são estimulantes para o exercício da sexualidade mais prazerosa, portanto, mais gratificante. Não devemos pensar em sexo somente na hora de praticá-lo. As descobertas dos pontos sensórios e as fantasias obtidas durante a masturbação devem ser divididas com a parceira(o).
Sabemos que existem os masturbadores obsessivos-compulsivos que fogem à normalidade. Estes devem ser tratados pelo terapeuta sexual, por apresentarem um comportamento desviante.
Estamos, nesta matéria, escrevendo sobre a masturbação como maneira de dar e receber carinhos, abrindo espaço para a felicidade a qual temos direito. Não devemos permitir que, os sentimentos de culpa nos coloquem num claustro fóbico, sufocando a nossa eroticidade a ponto de não termos o direito de tocarmos o nosso próprio corpo. A educação que recebemos, se foi usada como instrumento de submissão, não deve se perpetuar. A educação é libertadora.
O nosso corpo é um reprodutor de vidas, garantindo a perpetuação da espécie, mas também, é um instrumento de gozo e beleza. Esta visão crítico-amorosa nos liberta da vergonha e dos medos, fortalecendo-nos para exercer, em todo seu esplendor, a nossa sexualidade.