Arthur Soffiati

Professor de história e eco-historiador
Mestrado e doutorado na UFRJ

Arthur Soffiati

Professor de história e eco-historiador
Mestrado e doutorado na UFRJ

Nos anos 1970, Paulo Nogueira Neto, Secretário Nacional do Meio Ambiente no regime militar, proclamou que a Amazônia estava em chamas. Havia protestos contra a abertura da Rodovia Transamazônica na sociedade e na imprensa, mas eram tímidos por conta da censura. As condições ambientais da maior floresta equatorial do mundo começavam a sofrer perigosas mudanças.

Não podíamos imaginar que os rios da maior bacia hídrica do mundo fossem sofrer as oscilações drásticas da atualidade. O mundo amazônico parecia incólume a agressões.

Passei o mês de maio de 2025 nessa grande floresta, viajando do extremo noroeste ao extremo nordeste. A primeira impressão que tive, ainda do avião que desceria em Manaus, foi a de um mundo aquático infinito. Navegando na foz do rio Negro, entrei no rio Solimões. Pensei nas secas que assolaram esses rios no último trimestre de 2023 e 2024. Não pude imaginar o sumiço de toda aquela água à minha frente.

Fui a São Gabriel da Cachoeira, no alto rio Negro. O nível hídrico mostrava-se ótimo. Uma moradora da cidade convidou-me a voltar lá no fim do ano para ver um quadro completamente diferente. Enfim, o desmatamento da grande floresta não apenas libera gases do aquecimento global. Ela sofre também seus efeitos. Os rios voadores, fundamentais para o Cerrado, o Pantanal e o Cone Sul estão se reduzindo drasticamente. O abate de árvores numa área da Amazônia reduz as chuvas necessárias para a floresta ainda de pé.

Naveguei de Manaus a Belém. As margens não eram visíveis. Navios cargueiros de grande calado navegam naquele mundo fluvial. Fui informado que aquele oceano doce fica reduzido a estreitos cursos d’água na estiagem.

Todo rio tem um pulso: uma estação de cheia e outra de estiagem. Agora, o pulso se acelera com as volumosas chuvas ou a escassez delas. As cheias se transformaram em enchentes. Elas podem se avolumar e provocar transbordamentos. Se invadem lavouras, pastos e cidades, as águas provocam alagamentos. Os níveis dos rios têm subido de forma incomum na Amazônia. Quem imaginaria que núcleos urbanos inteiros ou periféricos sofreriam com as enchentes na Amazônia? A locomoção pública fica comprometida. Os governos precisam construir passarelas. Nessas ocasiões, o lixo se acumula de maneira impressionante nos bairros pobres. Os povos nativos nunca poderiam imaginar um quadro como esse.

O volume pluvial precipitado sobre o Rio Grande do Sul em 2024 e 2025 ou o que causou catástrofe no Texas em 2025 seria absorvido pela floresta amazônica. Mas as enchentes na grande floresta estão aumentando também por falta de retenção das águas, além da precipitação pluvial. Algo a ser confirmado ou não.

Por outro lado, as secas se tornam cada vez mais severas. Os recordes se sucedem. Desmatamentos e queimadas afetam as chuvas no céu e seus efeitos na terra. Em qualquer lugar, a escassez de água é mais danosa ao ambiente e às pessoas que o excesso dela. As secas na Amazônia se superam ano a ano. Elas causam estresse ao ambiente, como a morte de invertebrados, peixes e mamíferos. Para os humanos, a escassez de água afeta as lavouras, as pastagens e as pessoas diretamente. A água se torna imprópria para consumo. As distâncias, antes percorridas em embarcações, devem ser feitas a pé. Cientistas recomendam que as populações locais devem perfurar poços para obter água de melhor qualidade.

E isso tudo num bioma que foi o paraíso das águas por milênios, séculos e anos.

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