Arthur Soffiati

Professor de história e eco-historiador
Mestrado e doutorado na UFRJ

Arthur Soffiati

Professor de história e eco-historiador
Mestrado e doutorado na UFRJ

Vivemos num mundo mergulhado em crise. Há quem diga que a humanidade vive em crise desde seus primórdios. Se é assim, o conceito de crise perde o sentido. Se existe uma crise permanente em todos os campos, a crise passa a ser a normalidade, não a exceção. Economistas, sociólogos, historiadores etc reconhecem momentos de “crise” e de “estabilidade”.

Nos últimos 500 anos, o sucesso da economia (também com suas crises) corresponde a uma crescente crise ambiental. O marco inicial da crise ambiental não foi a Revolução Industrial, na Inglaterra do século XVIII. Ela se situa no século XV, com a expansão marítima da Europa ocidental. Movidos por uma economia que considerava a natureza ilimitada na sua capacidade de fornecer recursos e de absorver resíduos, os países europeus garimparam, desmataram, caçaram, poluíram excessivamente a natureza.

Espécies foram extintas e populações inteiras foram escravizadas. Outras foram dizimadas e obrigadas a se converter aos valores ocidentais. Atualmente, toma-se consciência de todo esse processo pelo mundo. Movimentos sociais em defesa do ambiente, das mulheres, dos diversos gêneros, dos valores culturais oprimidos adquirem vulto crescente.

Num meio de crise mundial, o ser humano está sujeito a doenças físicas e mentais, que não devem mais ser separadas. O paradigma médico ocidental, baseado nos laboratórios, nos exames, nos medicamentos alopáticos, não consegue cumprir suas promessas de cura, até porque, não há consenso quanto ao conceito de cura.

Além do mais, a medicina ocidental não dá conta de tratar a humanidade, pois as desigualdades sociais são profundas. A tecnologia médica não conseguiu escapar do sistema econômico de mercado. Há muitos médicos com valores éticos a denunciar o caráter elitista da medicina. Mas a maioria desses críticos não ultrapassa as fronteiras do social. Uma medicina que atendesse a toda humanidade pressupõe justiça social. Mesmo que ela seja alcançada algum dia, os impactos ambientais continuariam. Teríamos justiça social com aprofundamento do caos ambiental.

Existem ardorosos defensores do paradigma médico ocidental que hostilizam os saberes médicos do passado e de outras culturas que não a europeia. No ato de formatura, o médico deve prestar o juramento de Hipócrates, o patrono maior da medicina. Contudo, nada mais longe da medicina atual que os ensinamentos de Hipócrates. Em que disciplina das escolas de medicina, lê-se o tratado hipocrático “Influências da atmosfera, da água e do meio” ou algum livro de Joseph Needham sobre ciência chinesa?

O conhecimento de medicina por outras culturas que não a ocidental pode ter sido superado pelo ocidente, mas ele enfatiza a influência ambiental sobre a pessoa e a sociedade. Um tratamento do indivíduo, por mais refinado que seja, é incompleto se não levar em consideração o meio socioambiental em que ele vive.

Enfim, uma disciplina sobre saúde e ecologia nas escolas de medicina é imprescindível nos dias atuais. Os profissionais de saúde precisam relacionar mudanças climáticas, desequilíbrios ambientais, poluição do ar, da água, do silêncio, da escuridão, da caça etc…com a emergência de doenças contagiosas, transmissíveis, degenerativas, nutricionais e outras.

Copyright © 2023 Todos os Direitos Reservados. | Desenvolvido por Agência Destake – Criação de Sites